sábado, 23 de outubro de 2010

Factóides e Fantasias


O tempo anda nebuloso por aqui, apesar do sol radiante e do colorido de Horário Eleitoral. Trava-se agora uma velha e milenar luta: do Bem contra o Mal. Em nome do jogo tudo é permitido. A baixaria toma conta da grande arena verde e amarela. Ao invés do confronto de idéias e propostas há o confronto de escândalos e a exposição de mentiras. Vendem-se ilusões. Compram-se consciências. Ganha mais quem perde menos. Quem sairá vencedor ninguém sabe ainda. Quem perde é o povo, que nesse jogo tem sua única oportunidade de participar e decidir. Que difícil decisão. O Bem vem fantasiado de gnomo, doce e cândido, quase meloso. O Mal se apresenta como um fantoche, muita convicção e pouco conteúdo. Até Deus fora evocado a participar, tomar partido ou se filiar: quanta heresia!
Na guerra pelo poder, os membros do clã de Poliana, mais espertos e ardilosos que a turma de oposição, criou novas armas: os factóides. Trata-se de instrumento muito astuto e elaborado, usado tanto para defesa do Grande Clã, quanto para ataque aos adversários. O esquema funcionava dessa forma: qualquer prova ou denúncia, por mais contundente que seja, contra os ilustres e dignos representantes do clã, são sempre factóides! Ilusões de ótica ou distorções de conceitos. Pura calúnia! Em contra partida: qualquer obra, feito ou mérito comprovado dos adversários são, sem sombra de dúvida: factóides! Perseguição política, atos reacionários de uma elite que quer explorar os pobres e excluídos. Tudo muito claro, lógico e incontestável, como a democracia Cubana e a liberação feminina no Irã. Quem questiona essa lógica é sempre uma pessoa do mal. Deus (que Poliana tem certeza milita em sua causa) que tenha piedade dessas pobres almas indignas e impuras.
Na cartilha sagrada do Grande Clã, as regras e normas são perfeitamente claras e irrefutáveis. Só quem tem capacidade de discernimento e crítica é que não consegue entender. O direito de ir e vir é de todos! Todos os representantes do clã. Aos membros do clã, e somente a eles, é permitido coibir esse direito a qualquer outro reles mortal que não reze por essa magnífica cartilha. O direito a propriedade privada é indiscutivelmente de todos! Todos que sejam simpatizantes e militantes do clã. A propriedade de outros poderá ser em qualquer momento e sob qualquer pretexto invadida e depredada, desde que o ato seja apoiado e orquestrado pelo Grande Clã. A agressão física a adversários é sumariamente proibida. A menos, é claro e perfeitamente justificável, que seja executada por um angelical simpatizante do clã. Qualquer opositor que cambaleie ou se sinta ofendido física ou moralmente por estes atos, está obviamente tentando criar factóides! Iludir o povo ignorante e desestabilizar o estado de Direito do Grande Clã. A liberdade de expressão é inquestionavelmente garantida àqueles que louvam ao clã. Qualquer manifestação, minimamente contrária aos seus interesses, deve ser severamente censurada e punida, em nome da perpetuação do status quo e da soberania dos petralhas. Trata-se unicamente de justiça! A imprensa é plenamente livre para enaltecer qualquer feito do líder maior do Grande Clã: o Ilusionista. Qualquer tentativa de profanar esta ilustre figura com denúncias, acusações ou críticas trata-se da mais vergonhosa e desonesta forma de perseguição midiática. Só os membros do Grande clã é que detém o monopólio da ética, moral e honestidade. Qualquer outro cidadão que alegue ter idéia semelhante está, sem sombra de dúvida, tentando criar: factóides. Quando o clã usa de estratagemas para violar sigilo fiscal de algum cidadão é sempre com o distinto intuito de promover a transparência. Quem questionar a legalidade ou moralidade do ato está indignamente recorrendo a factóides.
Por fim, a verdade mais importante e cristalina propagada pelo Grande Clã, e repetida como um mantra por cada crédulo companheiro de fantasia e arrebatamento : essa imensa Nação, seus campos verdejantes e o céu azul anil, foram inegavelmente criados pelas hábeis e divinas mãos do Ilusionista. Antes Dele, só havia céu nublado, solo árido e deserto. Qualquer velho e bolorento livro de história que afirme que o país tenha mais do que oito anos de idade, deve ser definitivamente queimado ou escondido para não servir de base a construção de factóides.

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