sábado, 5 de maio de 2012

Poliana: Remendando Tropeços

- Vamos lá Poliana! Presta atenção aqui. – reclama um companheiro apontando para as peças sobre a mesa.
- Agora não! Me dá uma folga, eu não agüento mais isso tudo.
- Não adianta nada reclamar rainha, nós mal começamos o jogo.
 - Eu já estou cansada de olhar para essas peças. Nada parece encaixar direito. Quando se arruma de um lado, estraga de outro. Que inferno essas tais de coligações! Quem foi que inventou esse negócio afinal?
- Oposição é claro! De onde mais poderia sair idéias tão traiçoeiras e desleais.
- É mesmo, isso é coisa antiga. Eu até me lembro como nós criticávamos esse mercado de pastas e carguinhos. Parece que foi ontem. - relembra Poliana enquanto lixava as unhas.
- Credo Poliana, isso já faz um tempão! Ontem foi quando nós dizíamos que piso não era teto, e que só o telhado dos outros é que era de vidro.
 - Telhado de vidro todos nós temos. Só que o nosso é mais transparente que o de Oposição. – defende o empertigado Farofinha acostumado a sua posição de escudeiro real.
- É a pura verdade. – apóia eloqüente uma matriarca do clã. - Oposição não tem uma causa. Um ideal. Só defendem os interesses de uma elite dominante que explora o reino desde seu descobrimento e...
 - Chega de conversa mole! Só estamos nós aqui, ninguém precisa ficar pregando moral de cuecas. – exaspera-se Líquen, entediado com o velho e rançoso discurso.
- Nisso, até eu que sempre achei essa ladainha de nosso clã cansativa, tenho que concordar com vocês companheiros. – continua a rainha recostada nas almofadas. - Nossos éticos e transparentes membros sabem como ninguém pregar moral com as cuecas recheadas de propinas. Essa aprimorada técnica nem a tarimbada Oposição conseguiu fazer emplacar.
- Não sei não. Acho até que eles conseguiam, só que não eram pegos com as peças íntimas abarrotadas. Talvez fosse o modelo de cuecas e meias que eles usavam. A elite pode ser desprezível, mas tem lá o seu refinamento. – conclui um assessor de assessor com certo despeito.
- É possível meus adoráveis bobos. O pessoal de nosso clã sempre adorou um estardalhaço. Foi assim que chegamos tão longe. Infelizmente, a companheirada não pode ver uma migalha de propina ou um farelo de recurso público que se atira que nem porco em lavagem. É sujeira pra todo lado. Até Oposição fica constrangida.
- Vamos acabar com essa sessão nostalgia. Não adianta ficarmos aqui remoendo o tempo em que parecíamos limpos e decentes. Não vendemos toda aquela balela de ideologia e sociedade justa para chegar até aqui e jogar tudo fora por falta de coalizão. Precisamos montar logo esse quebra-cabeças.
 - Coalizão não vai ser problema seus bobões. Deve ter uma fila de pretendentes doidinhos para aderir com essa adorável e escultural rainha. – ronrona Poliana, maliciosa. – Afinal eu além de linda sou esperta e ardilosa. A resistência maior eu já venci. Aqueles patéticos e rancorosos membros de nosso clã que passaram anos criticando meu reinado já estão dóceis como cachorrinhos. Foi só jogar uns petiscos pra uns e arrumar umas cadeirinhas pra outros, e pronto! Estão todos dispostos a abanar os rabinhos, digo, as bandeirinhas para sua adorada Poliana.
 - Acontece que nós sozinhos não vamos a lugar nenhum alteza. Precisamos de mais alguém pra nos carregar. E nem todo mundo tem tão pouco apego a moral quanto nós. Até alguns que aderiram conosco já estão pensando em roer a corda depois de nossos pequenos desvios éticos.
- Isso é só pra se fazer de difícil. Conheço bem essa tática. É só nos acenarmos pra eles com uns maços de dinheiro, meia dúzia de chefias e mais uns carguinhos, que essa gente esquece rapidinho esse negócio de raízes históricas. Afinal, erva daninha tem raízes muito frágeis. Só se fixam firme e fortes como guanxuma, no solo fértil do poder. E eu sou a dona absoluta do poder. Com poder, dinheiro, astúcia, muita mídia e meia dúzia de trouxas pra me carregar, eu continuarei a ser a estrela mais brilhante desse reino. – decreta Poliana, jogando o quebra-cabeças no chão, com pose de criança birrenta.
- Só espero que o excesso de ego da rainha não apague a chama que nos aquece e atice um enxame de opositores para encobrir nossa estrela. – murmura um preocupado articulador real.

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