domingo, 17 de março de 2013

A Eterna Fumaça Negra da América Latina


O mundo inteiro parara e aguardara, em ansiosa expectativa, pela consagrada fumaça branca que surgiria no céu. Os verdadeiros cristãos oravam com fervor. Os céticos faziam ares de pouco caso. Os cínicos cultivavam descrença e desesperança. Houve até quem fizesse apostas em bolões um tanto pecaminosos. Mais uma estratégia de marketing, acreditavam outros, para angariar fieis desacreditados na milenar doutrina. E eis que, mais rápido do que contavam os céticos e os cínicos, o novo Papa fora escolhido. E para desalento de outros, cativara rapidamente a multidão de católicos. Um pontífice simples e despretensioso. De olhar cândido, sorriso tranquilo e postura humilde. Um Jesuíta, apenas. Menos do que esperavam os apostadores. Mais do que sonhavam os descrentes na Santa Igreja. Mas, em tempos de informação instantânea, as retaliações e os ranços surgiram na velocidade da luz, turvando com a fumaça negra das acusações a imagem do primeiro Francisco das multidões. O Papa apoiara ditaduras e tiranos, bradavam alguns nas redes sociais, com o mesmo ardor com que erguiam-se em defesa de ditadores caribenhos e questionáveis democracias bolivarianas. A contradição e a tirania pareciam estar na alma da velha América Latina. Gravadas a ferro, fogo e devoção. Das veias abertas de nossa América Católica ainda jorravam paixões cegas e alienadas e o sangue quente e rubro dos miseráveis. Os miseráveis defendidos por Francisco, o novo pontífice.
Que estranha luta manchava o solo desta América Latina. Que estranha sina carregava esse sofrido povo. Um povo humilde e devoto, sempre pronto a abraçar as mais estapafúrdias ideologias, os mais cruéis e insolúveis ditadores ou populistas. O poder emana do povo, enquanto o mesmo povo chafurda na lama densa da miséria, da desigualdade e da corrupção. Os poderosos continuavam os mesmos, travestidos com pompas, glórias e utopias vazias de significado prático. A miséria, a fome e a desigualdade mudaram de cara e de cheiro nas propagandas institucionais de cada demagógico país da latino-américa dos excluídos. Um povo, soberano povo, sutilmente alijado do poder da educação, da cultura e do livre arbítrio, mas sabidamente detentor do poder do voto. O voto que mantinha quadrilhas. O mesmo voto que sustentava tiranos. O eterno voto que perpetuava desigualdades e alicerçava a pobreza dessa gente sofrida. Mas, assim mesmo, o democrático e sonhado voto.  Graças aos céus pelo poder do voto, bradavam aqueles que defendiam ditaduras caribenhas, em uma cruzada de incoerências. A escolha do Papa deveria ser por aclamação popular, acreditavam esses mesmos. Quem sabe um conclave em alguma rede social ou em algum espetáculo virtual, onde as virtudes fossem sutilmente transformadas e os defeitos virtualmente maquiados para deleite da intelectual sociedade cibernética e para manutenção da associação de excluídos pelo cabresto da ignorância original. Que Deus proteja e ilumine Francisco das contradições de sua América Católica que, como dizia o poeta, “sempre precisará de ridículos tiranos.” Tiranos escolhidos pelo povo. Essa é a nova ordem de nossa peculiar e maravilhosa América Latina.  A América de Francisco das multidões e dos excluídos.

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