domingo, 18 de outubro de 2015

PRO Poliana


 A chuva desabava sem piedade sobre o reino de Poliana, e levava consigo o pouco que restava da pavimentação asfáltica. A impressão dos súditos que trafegavam nas maltratadas vias públicas era que muito em breve o reino inteiro seria engolido pelos buracos e desapareceria do mapa. Talvez fosse essa a intenção da rainha e sua paquidérmica corte. Alguma utilidade deviam ver na esburacada situação. Quem sabe, fosse a velha e surrada tática de colocar o bode na sala. Fazer os motoristas sacolejarem até o limite da paciência para depois oferecer a solução e colher os frutos. No ritmo lento com que sua alteza e seus bobos se movimentavam, melhor seria plantar tomates nos tais buracos, ao menos garantiriam os frutos. A inércia de seu primeiro reinado permitira que os buracos se encontrassem, acasalassem e se multiplicassem feito praga. Agora, não havia piche e pó de brita que dessem conta do problema. Nos áureos tempos do alinhamento fisiológico, quando dinheiro caía do céu, Poliana deslumbrava-se em inaugurar canchas de bocha e churrasqueiras, deixando a manutenção das ruas de lado e democratizando o acesso aos buracos. Hoje em dia, tragicamente, só o que cai do céu é chuva, fazendo brotar os malditos buracos que, cheios d'água, mais pareciam banheiras de ofurô. Quem sabe devesse começar a inaugurar banheiras de ofurô na periferia. Ou condomínios de buracos para os sem-teto.
Poliana precisava com urgência encontrar uma forma criativa de enrolar os contribuintes. Para isso, já anunciara, com a devida pompa e publicidade, mais um ousado, democrático e inovador programa para por fim ao problema. O PRO – Projeto de Remendo Ostensivo. Mais uma obra com a cara de Poliana, especialista em ilusão de ótica. E com que facilidade se iludia o povo, constata a monarca. Era só uma questão de números. Seu povo, todos sabem, não era lá muito afeito a matemática, portanto era só propalar alguns números robustos que o sucesso estava garantido. E serão milhões de recursos públicos, toneladas de pó de brita, milhares de metros quadrados, dezenas de ruas, quilômetros de vias repavimentadas. Verdadeira apoteose. O povo assistia as propagandas embevecido, sonhando com o negro tapete a revestir todo o reino. Poliana estava oferecendo aos contribuintes a oportunidade única de trafegar suavemente pelas vias recauchutadas, sem solavancos. Solavancos esses, que não existiriam se Poliana e sua trupe tivessem feito o necessário em seu devido tempo. Agora, o povo deve louvar e agradecer sua alteza por sua benevolência. Na prática, contudo, a conversão dos números revelava que o projeto era um pouco mais modesto do que a marquetagem oficial fazia parecer. Cada bairro do reino terá, apenas, sua principal via de comunicação ao centro reasfaltada e remendada, e mais algumas acessórias. E todas as outras centenas de ruas que encontram-se em estado de calamidade? Permanecerão agonizando, carcomidas por buracos, é claro. Pura falta de sorte dos milhares de contribuintes que não residem ou trafegam unicamente nas vias contempladas pelo remendão. Sorte mesmo seria morar e trafegar nos vídeos promocionais de Poliana. Aos desassistidos pelo programa de inclusão asfáltica da rainha, restava sacolejar por mais alguns anos. Sacolejos, avarias e transtornos que, segundo sua majestade, seriam muito melhor tolerados por seus súditos ao saberem que a poucos metros ou quilômetros existe uma via de asfalto novinho, feita com todo carinho por nossa adorada e prestimosa monarca Poliana, a rainha das meias verdades e do marketing ostensivo, pago com dinheiro público.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Havendo dificuldades na postagem dos comentários, o campo URL poderá ser deixado em branco.