domingo, 31 de janeiro de 2016

O sujeito oculto


Em Gigante Adormecido os imóveis roubavam a cena. Sítio e apartamento na praia, que ao que parece não pertencem a ninguém, faziam a festa de Imprensa Livre. Tudo parte de uma complexa e habilidosa estratégia midiático-judicial para denegrir a imagem de um mito: o Ilusionista. O inventor da retidão e detentor do monopólio das virtudes. Não há vivalma mais honesta que o messias da companheirada. Tão pouco mais egocêntrica e megalomaníaca.

Seu único pecado era cultivar sólidas amizades. Amigos abnegados o cercavam feito moscas no lixo. Sabedores que eram todos de que suas inquestionáveis convicções socialistas o impediam de adquirir patrimônio, o presenteavam com pequenos mimos capitalistas. Uma coberturinha aqui, um sitiozinho acolá. Um elevador para poupar suas juntas judiadas pelo trabalho de uma vida. Diminutos e amistosos agrados desprovidos que intenções ocultas. Oculto, mesmo, só o nome do proprietário. Fatos corriqueiros no cotidiano do povo pagador de imposto, é claro. Quem no mundo não tem um amigo de fé sempre pronto a bancar a reforma de seu puxadinho ou os móveis da cozinha? Nada que devesse causar alarde na grande mídia golpista. Ah, que saudades dos tempos onde a imprensa era ética e um Fiat Elba merecia manchetes e derrubava corruptos.

Um disparate ousar atacar a imaculada história do Pai dos Pobres. Dos pobres e das empreiteiras. Ele só tinha um defeito, isso até seus seguidores aceitam, era um pouquinho distraído. Interessante característica para quem sempre se colocara no centro no mundo, e do poder. Curiosamente, enquanto governante, não percebeu o dinheiro escorrendo nos propinodutos para compra de apoio parlamentar a seu projeto de poder. Ele nada vira ou ouvira. De nada sabia. O engenhoso e vultuoso esquema de corrupção que corrói a estatal petroleira também passou batido pelo sempre visionário Ilusionista. Assim como as milionárias cifras que abasteciam os cofres da companheirada. É comovente o desapego desse homem com o dinheiro. O dinheiro do povo, ao menos.

Enquanto a roubalheira corria solta sob suas barbas messiânicas, ele era agraciado por dádivas divinas. Todos os escolhidos que o cercavam enriqueciam rápida e prodigiosamente.  Presente do Criador a mais iluminada de Suas criaturas, com certeza. Faltava-lhe apenas uma visão um pouco mais apurada. Padecia de uma estranha e seletiva miopia, o Ilusionista. Certamente um pequeno deslize em sua criação. Tomara que o problema não tenha atrapalhado na escolha do porcelanato ou do revestimento da piscina. Uma nova reforminha seria um transtorno para seus fiéis e dedicados amigos empreiteiros. E um inconveniente para o Ilusionista e sua família, também. Obras trazem consigo a sujeira do cimento e da poeira, e o Pai dos Pobres sempre se sentiu mais confortável e limpo em meio ao dinheiro sujo. A sujidão de caráter é a mais próspera ideologia, ao menos assim parece.

 

 

 

 

 

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